Sexta, 14 de Fevereiro de 2025 21:59
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Internacional Ética e Sociedade

Jornalismo não é fofoca: Zuckerberg, Musk, e a Nova (des)Ordem Mundial

O posicionamento recente de Mark Zuckerberg, declarando que a Meta, não deveria ser responsável pela verificação de informações divulgadas na plataforma. Uma afirmação que, longe de ser inócua, levanta questões graves sobre o papel das big techs na perpetuação de desinformação e nas suas consequências para democracias frágeis, como a brasileira.

16/01/2025 09h10
Por: Clara Santos
https://www.facebook.com/story.php?story_fbid=1158193465672950&id=100044469218088
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Com o aumento exponencial de conteúdos falsos, especialmente em contextos eleitorais, observa-se um enfraquecimento dos pilares que sustentam a verdade factual e o debate público saudável.

Em um país como o Brasil, onde a manipulação de informações e o impacto devastador das fake news já tiveram consequências reais e mortais, como na eleição de 2018, marcada por uma avalanche de desinformação no WhatsApp, ou nos ataques golpistas de 8 de janeiro de 2023, essa postura é mais que irresponsável. É cúmplice.

O Brasil é um laboratório global de desinformação. Em 2018, a campanha eleitoral de Jair Bolsonaro foi marcada por uma avalanche de fake news disseminadas via WhatsApp. Segundo uma investigação da Folha de S.Paulo, empresas financiavam ilegalmente o disparo em massa de mensagens falsas, atacando opositores políticos e manipulando eleitores com conteúdos apelativos.

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O resultado foi a eleição de um governo que, nos anos subsequentes, adotou uma postura abertamente negacionista em relação à saúde pública, durante a pandemia de Covid-19, contribuindo para a morte de mais de 700 mil brasileiros.

Outro caso emblemático ocorreu em 2023, quando grupos extremistas atacaram o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal. Esses atos foram organizados em grande parte por meio de redes sociais, onde informações falsas sobre supostas fraudes eleitorais circularam sem controle. Esses episódios demonstram que a falta de regulamentação das plataformas digitais não é uma questão neutra; ela é fatal.

Além disso, a descredibilização do jornalismo, impulsionada por discursos populistas, alimenta o ciclo de desinformação. O jornalismo, muitas vezes acusado de ser um “motor ideológico,” enfrenta uma população que prefere consumir conteúdos superficiais e sensacionalistas. Essa inversão de prioridades reflete um desprezo pelo conhecimento crítico, fomentado por elites que têm interesse em manter a população desinformada e alienada.

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A negligência deliberada de Zuckerberg e de outros titãs tecnológicos, como Elon Musk, transforma a internet em um terreno fértil para o caos. O Twitter, sob a liderança de Musk, já mostrou que "liberdade de expressão" é um pretexto para alimentar extremismos e silenciar vozes progressistas.

O recente embate entre Musk e o ministro Alexandre de Moraes, envolvendo o descumprimento de ordens judiciais no combate ao discurso de ódio, ilustra como esses bilionários não apenas desafiam governos, mas atuam como soberanos sem território, arquitetando políticas globais à margem de qualquer democracia.

Musk utilizou sua posição para desafiar as leis de um país soberano, colocando seus interesses financeiros acima da estabilidade democrática. Essa postura evidencia como as big techs se posicionam como entidades supranacionais, desafiando os Estados e consolidando um poder que transcende fronteiras. 

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Zuckerberg e Musk não são apenas empresários; são arquitetos de um novo modelo de controle global. A Meta, ao recusar a verificação de informações, legitima a proliferação de discursos extremistas e teorias conspiratórias.

Já Elon Musk, ao assumir o Twitter, promoveu uma suposta “liberdade de expressão” que serviu como pretexto para desregular a plataforma, permitindo a disseminação de discursos de ódio e desinformação.

Enquanto isso, o jornalismo, uma das poucas trincheiras contra a desinformação, é desmoralizado por uma parcela da população que prefere reduzir o ofício à "fofoca ideológica." Para muitos, é mais interessante discutir a nova tatuagem de Anitta ou a traição de Neymar do que investigar como os Capacetes Azuis da ONU perpetuam dinâmicas de poder imperialistas na Síria.

Essa inversão de prioridades não é casual: é um reflexo direto de um sistema que prefere uma sociedade alienada. Afinal, uma população entretida e desinformada não questiona. E é exatamente disso que Zuckerberg, Musk e a elite midiática global se beneficiam.

Essa elite, ao contrário do que muitos pensam, não é apenas uma conspiração de bilionários enclausurados em salas secretas. É um sistema orgânico, que se alimenta das falhas do capitalismo tardio.

Bilionários como Bezos, Musk e Zuckerberg aumentaram suas fortunas às custas de uma classe trabalhadora exaurida, enquanto governos supostamente democráticos falhavam em proteger suas populações.

A pandemia de 2020 escancarou as desigualdades globais, mas também abriu caminho para a consolidação de uma nova ordem mundial digital. Aplicativos de entrega e plataformas de streaming cresceram enquanto trabalhadores eram esmagados por jornadas extenuantes.

Essa nova ordem é o resultado direto das derrotas históricas do capitalismo. É o ponto onde a alienação, a desigualdade e o hiperconsumo convergem com a hiperconectividade. Na superfície, ela oferece liberdade — de expressão, de consumo, de escolhas. Mas essa liberdade é ilusória. Ela é controlada por algoritmos projetados para alimentar ódio, polarização e vícios, transformando a internet em um campo de batalha psicológico e ideológico.

Os Estados Unidos, que por décadas se apresentaram como os "defensores da liberdade," são o maior exemplo dessa perversão. Eles exportaram guerras sob a bandeira da democracia, financiaram golpes de Estado e consolidaram regimes autoritários quando isso lhes convinha.

Agora, exportam um modelo de internet que promove o individualismo tóxico, desregulamentação e exploração sem precedentes. Não é coincidência que figuras como Zuckerberg e Musk prosperem em um sistema assim. Eles não são outliers; são produtos perfeitos dessa distopia.

A pandemia de 2020 foi o catalisador de mudanças estruturais que já estavam em curso. Enquanto milhões de pessoas enfrentavam desemprego, insegurança alimentar e colapso dos sistemas de saúde, bilionários como Bezos, Musk e Zuckerberg aumentaram exponencialmente suas fortunas. A digitalização acelerada pela pandemia aprofundou desigualdades, transformando a internet em uma ferramenta de exploração.

Essa nova ordem mundial digital é caracterizada por:

Desinformação massiva: A manipulação de algoritmos privilegia conteúdos sensacionalistas e polarizadores, em detrimento de informações confiáveis.

Concentração de poder econômico: As big techs acumulam riquezas em níveis sem precedentes, enquanto trabalhadores enfrentam condições cada vez mais precarizadas.

Desregulamentação global: Governos têm dificuldades para regular plataformas que operam em escala transnacional.

Alienação digital: A promessa de “liberdade” na internet mascara um modelo que incentiva o consumo desenfreado e a vigilância em massa.

Os Estados Unidos, que historicamente se apresentam como “defensores da liberdade,” são os maiores responsáveis pela consolidação dessa distopia. Desde a Guerra Fria, financiaram golpes e guerras em nome da democracia. Agora, exportam um modelo digital que consolida desigualdades e destrói democracias.

Mas o que fazer diante desse cenário? Como romper um ciclo tão bem estruturado? A solução passa, inevitavelmente, por uma transformação radical. Não há atalho ou paliativo. É preciso confrontar o capitalismo tardio em todas as suas expressões: da financeirização da economia às dinâmicas de poder concentradas na tecnologia.

Isso começa com regulamentações robustas para as big techs, que deveriam ser tratadas como serviços públicos essenciais, e não como empresas privadas. É necessário taxar bilionários de forma justa, para redistribuir os recursos que acumulam às custas de milhões. Acima de tudo, é fundamental fortalecer a educação e o jornalismo independente, para que a população possa enxergar além das cortinas de fumaça que essas elites erguem.

A superação dessa ordem mundial exige uma transformação profunda. Entre as medidas necessárias estão:

Regulamentação das big techs: As plataformas digitais devem ser tratadas como serviços públicos essenciais, com obrigações legais claras para combater desinformação e proteger direitos fundamentais.

Taxação de bilionários: A riqueza acumulada pelas big techs deve ser redistribuída por meio de impostos justos, financiando educação, saúde e inclusão digital.

Educação midiática: É urgente ensinar a população a consumir e interpretar informações de forma crítica, combatendo a alienação digital.

Fortalecimento do jornalismo independente: Garantir financiamento público e autonomia editorial para veículos que se comprometem com a verdade factual.

No entanto, o problema não é só institucional. É humano. As pessoas são reflexos da informação que recebem — ou da ausência dela. Num mundo onde algoritmos moldam mentes e narrativas, resistir significa reumanizar. Significa buscar o conhecimento, a empatia e a consciência crítica que a ordem vigente tenta sufocar.

Essa luta, no entanto, só será possível se encararmos uma verdade difícil: o sistema não mudará por vontade própria. Ele adoece mentes e destrói o planeta porque é essa sua natureza. E nós, enquanto sociedade, temos aceitado isso passivamente, como se fosse uma lei da física. Não é. É uma construção humana. E, como tal, pode — e deve — ser desfeita.

O capitalismo tardio não é inevitável. Ele é um monstro que alimentamos todos os dias, cada vez que clicamos, consumimos e silenciamos nossas consciências. Parar de alimentá-lo não será fácil, mas é urgente. A mudança começa com pequenos atos de rebeldia cotidiana: apoiar o jornalismo independente, rejeitar a superficialidade e exigir responsabilidade daqueles que detêm o poder.

No final, a verdadeira revolução não está nos algoritmos ou nas plataformas, mas na coragem de romper com a apatia. Como sociedade, precisamos decidir se vamos continuar sendo cúmplices desse sistema ou se finalmente teremos a ousadia de sonhar com algo diferente. Porque enquanto Zuckerberg e Musk brincam de deuses digitais, o mundo real sangra. E a escolha entre assistir passivamente ou lutar está, e sempre esteve, em nossas mãos.

O capitalismo tardio, na sua expressão digital, é a materialização de um sistema que adoece o mundo e as mentes. As elites globais, personificadas por figuras como Zuckerberg e Musk, são produtos e agentes dessa distopia. Mas essa ordem não é inevitável; é uma construção humana, que pode ser desconstruída.

A transformação começa na resistência cotidiana: apoiar o jornalismo independente, boicotar práticas exploratórias e exigir políticas públicas que priorizem a vida acima do lucro. No entanto, essa resistência também exige coragem para questionar o que nos tornamos como sociedade.

Se continuarmos aceitando passivamente esse modelo, estaremos condenados a um futuro de alienação, desigualdade e colapso democrático. A mudança é possível, mas exige urgência, reflexão e ação. E enquanto não fizermos isso, continuaremos a alimentar o monstro que, dia após dia, consome a nossa humanidade.

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